Adélio Dani é um
jovem de trinta e três anos que sonha ver a família unida, e seus pais sonham
que ele seja bem sucedido na vida. Mora com a mãe, Belaflor, carinhosamente
chamada de Dália, florista de profissão. O pai, para melhorar a qualidade de
vida da família, saiu de casa há dezasseis anos para embarcar numa traineira para
ir à pesca do bacalhau…ainda não voltou.
A vizinha da
frente, diz que o barco naufragou e ele morreu. Esta possibilidade foi o click para Adélio Dani pensar durante quinze
segundos, em seguir a carreira de nadador-salvador. A vizinha do lado diz que
tem visto o pai de Adélio Dani, nos últimos dezasseis anos, na freguesia da
Areosa, sempre acompanhado de mulheres! Esta segunda possibilidade mantém, em
Dália, a esperança secreta de que Augusto regresse a qualquer momento da faina…com
o bacalhau!
A noite carregada
de cinzento e a chuva persistente fazia o ribeiro que atravessa Campanhã rasgar
as margens, quando num barraco, bem próximo, rompem as águas de Dália. Sem
nenhum sinal celeste no céu, nem um sequer relâmpago, nesta noite de tempestade
a anunciar um nascimento especial, no momento do parto, a mãe berra, bem alto,
o nome do seu ídolo de sempre: - “ALAAAAAAIN DELONNNNNN!”. O berro termina
quando sai o último pedacinho de bebé do ventre. Em choro é colocado num berço
de palha por Rubi, que apanha o recém-nascido pelo cachaço. Durante este
momento de ternura entre o cão e o novo membro de família, Augusto, possuído
pelos ciúmes, sentimento superior à paternidade, berra com a mulher:
- Sua tola, até
no nascimento do nosso filho tu pensas nesse gajo?! – Grita Augusto enquanto
rasga a camisa.
- Boa! Não te
compro outra! – Diz Dália.
- O quê?! – Augusto
olha para si mesmo, e continua – O que é que eu fiz?! A minha melhor camisa! – E
voltando a fixar a mulher, muda o tom de voz para berros: – Visto a minha
melhor camisa para o pato e…
- Para o parto,
para o parto. – Corrige Dália, num tom de paciência.
- Para o parto e
tu dizes o nome desse Alain Delon, sua vadia!
- O quê?! Seu
pescador de meia tigela… tu deves ter escamas nas orelhas. O que eu disse foi:
“ Pelo meu querido filhinho, suporto qualquer dor. Sou uma leoa!” – Esclarece Dália,
num tom exaltado.
- Aaahh, leoa! Tu
és uma leoa! Enganaste-me bem, para me apanhares no altar… eu era o teu amor,
eras do FCP, sabias fazer bainhas…e agora és leoa? Só falta jogar um Alain
Delon no Sporting! Sua minhoca! Enganaste-me bem, enganaste!
- Tu é que me
enganaste quando te conheci! Dizeres-me que praticavas pesca desportiva no teu
barco, e eu a pensar que eras rico, e tu ias era à apanha da sardinha…seu
falso!
- Aaahh, falso
eu?! Iludida! Tu ouvias o que querias! Eu disse-te, e várias vezes, que praticava
pesca da tainha, na traineira do meu primo Angelino!
Rubi, o cão da
família, achando que aquele ambiente não era propício para um bébé, apesar de
ser um pouco mais colorido do que cá fora, decide intervir e pôr um ponto final
na discussão:
- Papá, mamã! – Ladrou
Rubi!
Dália e Augusto,
pasmados olham para trás, em direção ao berço de madeira onde está deitado o
bebé.
- Oi… isto é milagre!
O nosso menino falou! – Exclama Dália.
E os dois
aproximam-se do berço:
- Mas ele está a
dormir! – Diz Augusto.
- Mas falou, não
ouviste? – Pergunta Dália.
- Ouvi, ouvi…
temos que lhe dar já um nome. Se calhar amanhã vai-nos perguntar como se chama!
Tens alguma ideia? – Pergunta Augusto.
A vontade de Dália
era de pôr o nome do seu ídolo de sempre, Alain Delon, por quem se apaixonou
muito nova, quando no quiosque onde costumava comprar o almanaque trimestral de
ponto-cruz, viu-o do lado de lá, pendurado na capa de uma revista, foi amor à
primeira vista. Mas isso iria trazer discussões diárias ao seio da família,
devido aos ciúmes de Augusto.
- Não, não tenho
nenhuma ideia! E tu?
- Sei lá,
deixa-me pensar…humm… já sei. Podíamos pôr o nome do meu primo Angelino! – Propõe
Augusto.
- Estás louco. Para
me lembrar sempre desse chato, não?! – Retorquiu Dália.
- Então podia-se
chamar Emília! – Diz Augusto.
De repente,
furiosa, Dália agarra a pilinha do bebé e diz:
- Estás a ver
esta ferramenta? Isto é macho! – Depois aponta para Augusto – Tu, burro!
- É que eu sempre
gostei do nome Emília! Podíamos chamá-lo de João Emília! – Defende-se Augusto.
Dália, por
momentos, entra no domínio do delírio e imagina-se feliz com Alain Delon e o
filho de ambos. De volta ao mundo real, para ela não muito melhor do que o
tempo lá fora, não por não gostar do marido, mas por não ter o seu amor
próximo, responde-lhe:
- Esquece, já sei
como ele se vai chamar. O nosso menino vai-se chamar Adélio Dani!
Dália acha este
nome parecido com Alain Delon. Desta forma evita os ciúmes de Augusto e sente o
seu ídolo mais presente.
Nos dias seguintes,
apesar das insistências de Dália e Augusto para fazerem conversa com o filho
recém-nascido, Adélio Dani apenas chorava, dormia e mamava.
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