sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Aniversário/Advertising.

Hoje, 25 de Outubro de 2013, faz um ano que “postei” o primeiro texto, “Sábado, dia porreiro!”, neste blogue, “Escrita com Norte.”.
O nome do blogue surgiu, porque obviamente é escrita, e porque quem escreve (eu) é do Norte (Trofa) e pretende ter norte nas ideias. Este trocadilho, meio enigmático, género Dan Brow, dá estilo e é bonito…achei eu, e continuo a achar!
No dia em que o anunciei ao mundo (entenda-se grupo de amigos facebookianos), através desta rede social, foi da seguinte forma:

“Boa noite a todos, tendo 38 anos e para o ano fazendo 40, esta conta baralha-me a cabeça, porque deita por terra a certeza do 1+1=2.
Mas o que me confunde mais são os comentadores de televisão e bloguers, uma boa parte ex-políticos, que ajudaram a afundar o país, a dar palpites salvadores! Como tal, e sendo um pouco mais responsável, acho-me no direito de palpitar e publicar as minhas tretas no blogue que criei, com um pormenor de classe…tretas diversas, sobre o mundo, o país e a minha rua!
Convido-os a visitar o endereço www.escritacomnorte.blogspot.pt, e a palpitar.

Obrigado pela atenção!”

Mas a verdadeira intenção, não era mostrar ao mundo (entenda-se grupo de amigos facebookianos), que sou uma pessoa de extremo interesse intelectual e que tenho opinião sobre tudo. Porque isso, nós portugueses, temos gravado a ferros quentes nos nossos genes, e alguns com uma capacidade de indignação de fazer inveja ao Francisco Louçã ou a um qualquer político de oposição!
No dia 25/10/2012, estava a ser preparado o lançamento do meu 1º livro, e até agora único, com o título “Venceslau e outras histórias.”, que aconteceria em Dezembro, e por esta altura já me começavam a perguntar como era.
Para não cair no exagero dos opostos, ou seja, não ser demasiado modesto, ou demonstrar total falta de modéstia, a falar do livro que estava para vir, criei este blogue, arranjando forma fácil de responder à pergunta: - Como é a tua escrita?
Perante a pergunta, convido as pessoas a visitar o blogue e a descobrirem como escrevo, por si próprias!

O livro “Venceslau e outras histórias” é constituído por três histórias, a primeira, “Venceslau Júnior”; a segunda, “Zé Musgo” e a terceira “Eça Opes” com muitas outras personagens que interagem com as principais!
Há pouco tempo, um amigo conhecedor do livro, comentou que ler este livro é como “ir na auto estrada a 120 km e de repente meter marcha atrás!” Parece estúpido? Parece! Mas mergulhando no livro, entramos num mundo em que o absurdo faz sentido.
Deixo-vos duas, das várias críticas, que recebi, a primeira de um conhecido e a segundo de um desconhecido, que fez chegar a sua opinião até mim:

“A primeira das três estórias já li. Foi muito bom rir sozinho enquanto me tentava colocar naqueles lugares tentando ajustar cada personagem a uma realidade que de facto existe. A originalidade da viagem que o José Calheiros faz até ao mais simples do nosso povo e da nossa sociedade está surpreendente, recomendo que não percam e não deixem de comprar, é uma forma divertida de ver o que de mais genuíno existe. Todos temos em nós um pouco de Venceslau, e se não temos devíamos ter.”

“Um dia destes fui à Baixa do Porto e dei comigo a descer à zona da Ribeira. Já algum tempo que não ia lá, mas tinha ainda muito presente as imagens criadas pelo livro “Venceslau e outras histórias” de José Calheiros. As imagens são de tal forma reais, que me vi, quase inconscientemente, à procura do bar da “Associação dos Passarinhos de Miragaia”. Esperava encontrar lá os amigos Travassos e Peiroteu a conversarem com o Venceslau, com três minis á frente.
Percorri as ruas lentamente a pé, e esperava a todo o momento encontrar o Venceslau Júnior a “roçar o rabinho” nas esquinas, ou a Rosa (não sei porquê, imagino a Rosa, gorda, de buço, de leggings rosa, a mostrar umas curvas disformes e barriga empinada).
O que quero dizer, é que este livro somos nós, ou melhor, o lado “tosco” e risível de nós. Rimo-nos a valer porque reconhecemos as personagens, da as termos visto alguma vez, passando por nós, quase invisíveis. “Elas” existem e José Calheiros deu-lhes visibilidade da melhor forma, com um sentido de humor deveras singular.”

Uma semana após o lançamento da minha OBRA, como lhe chamam na editora, e já me tendo esquecido de muitos pormenores das histórias, li-o como se fosse a primeira vez e não conhecesse o autor. Tentei manter o distanciamento possível, para ter uma opinião honesta, e agora, sem receios de exageros, posso dizer que o livro, como escrita de entretenimento, é muito bom!

Quem ainda não leu e estiver interessado em adquiri-lo, pode falar comigo, pois tenho sempre alguns exemplares, ou pode fazer a compra on-line, através da Wook, da Bertrand e ainda pela Fnac. Também está à venda em algumas livrarias tradicionais. O preço de venda é de 11 €.

Se o blogue ainda não “morreu”, é graças à minha vontade de escrever e a vós, que o ledes.


Obrigado a todos pela receptividade e agradeço que partilhem!

domingo, 20 de outubro de 2013

Quase que chegava atrasado!

Estava na fase entre o sono e o despertar, aquela que não sabemos se estamos a dormir acordados ou a sonhar que estamos despertos e apercebo-me de três barulhos, o miar das minhas gatas, o toque do despertador, que por norma me obrigam a sair da cama, mas o outro som, o da chuva a cair lá fora, que me faz desejar que esteja a sonhar que estou acordado! Mas num vislumbre de realismo lembrei-me – Tenho consulta no hospital!
Passo por um momento de ódio ao mundo, que dura sete segundos, e pincho da cama, muito mais reflexo de uma obrigação do que de uma vontade.
São oito horas e doze minutos, lavo a cara, tomo o pequeno-almoço, lavo os dentes, visto-me, dou de comer à Clarinha e à Julieta, as minhas gatas, e vou rápido para o hospital, onde tenho consulta às nove horas.
Já no hospital sou atendido por uma menina, que me pede para aguardar que me chamem, ao fundo do corredor.
São oito horas e cinquenta e oito minutos e já estou na sala de espera. Quase que chegava atrasado!
Poucos momentos depois, abre-se uma porta, de onde aparece uma outra menina, que chama:
 – Sr. José… - “Sou eu!”, pensei, e a menina prossegue - …Vasques! Sr. José Vasques!
- Não, não! Sr. José…Sr. José Calheiros! – Digo eu para a menina, corrigindo-a.
Pelas minhas costas aparece um senhor de idade:
 - Sou eu, menina!
- Faça o favor de entrar, Sr. Vasques
Olho para o relógio. São nove horas e três minutos e pensei, “Devem chamar-me a seguir!”.
A mesma menina, mas por vezes outra, abriam a porta e chamavam sempre, ou por uma senhora, ou por um José, que teimava em não ser Calheiros…e eu continuava à espera!
As pessoas eram atendidas e iam-se embora, outras chegavam e eu continuava à espera. Este jogo de cadeiras na sala de espera do hospital da minha terra parecia mais uma actividade de tempos livres para idosos, fazendo com que eu, com trinta e nove anos, me sentisse um puto.
No vai e vem de gente, naquela sala, nem uma mulher jovem e gira, para eu encher o “papo” e me sentir apreciado e melhor passar o tempo…sim, vivo nesta ilusão, fruto de meia dúzia de elogios recebidos entre 1989 e 1993.
São dez horas e vinte e cinco minutos, e por detrás da porta aparece novamente a menina, a chamar:
- Sr. José…
E eu completo - …Calheiros. José Calheiros!
E a menina continua -… António Azevedo.
Ainda não era a minha vez. E cansado de estar de pé, sento-me; e cansado de estar sentado, levanto-me, e por mim passa a Dona Rosa, pessoa que quando fico até mais tarde no trabalho, aparece para limpar o gabinete.
- Olá, bom dia! – Cumprimenta-me.
- Olá Dona Rosa, por aqui?! Está tudo bem?
Após esta pergunta inocente, carregada de boa educação e acompanhada por um sorriso, Dona Rosa metralha-me com todos os seus problemas de saúde (como se lhe dessem algum conforto e sentido à vida), mais os da sua cunhada, que ainda consegue estar em pior estado!
- Sr. José! Sr. José Calheiros, é a sua vez. – Chama-me a menina, protegida pela porta.
Depois de ouvir a Dona Rosa, hesitei em responder ao chamamento da menina…sentia-me com saúde para dar e vender, mas lá entrei, já sem saber do que me queixar ao Sr. Doutor!

Saí do Hospital da Trofa às dez horas e quarenta e nove minutos. Dos três encontros marcados para depois da consulta, o primeiro dos quais ás dez horas, cheguei atrasado, tendo estas pessoas chegado atrasadas ao seus compromissos posteriores.
À noite nas notícias, ouço, “Barack Obama, está há três horas, à espera de Sérgio Humberto, candidato vencedor à Câmara da Trofa, para uma reunião!”.
Ups, ainda bem que não cheguei atrasado…à consulta!

domingo, 13 de outubro de 2013

Politicamente (in)correcto.

Zé Nabo é um homem responsável, que zela pela família e tenta transmitir os mesmos valores que recebeu de seu pai, o respeito pelos outros e a ter uma vida honesta, sem enganos. Abomina de tal forma a mentira, que ainda hoje tem dificuldades em adormecer, pelo facto de um dia um estranho lhe perguntar o caminho para o registo civil e ele dizer para seguir em frente e virar à direita na quarta rua, quando deveria virar na quinta.

Como pensa que um país é como uma casa, e vendo o que se passa com o seu, de fronteiras escancaradas, sempre que sai de manhã com a sua família, fecha as janelas e tranca a porta.
Num fim de tarde, quando chega a casa com a família e está a abrir a porta, é interpelado por Álvaro, dirigente de uma ONG, de barba, cabelo despenteado e camisola de bico com um padrão aos losangos, que se faz acompanhar de um “farrapo”, nitidamente consumido pela droga.
- O senhor é o dono desta casa? – Pergunta em tom arrogante.
- Sim! – Responde Zé Nabo, admirado com a intervenção daquele estranho.
- Pois é! Está a ver este jovem? – Pergunta, apontando para o toxicodependente.
- Simmm!
- Ele, hoje, tentou assaltar a sua casa, mas como vocês têm tudo fechadinho, ao forçar a janela o vidro partiu e cortou-se na mão. Teve que receber tratamento hospitalar! – Diz Álvaro, irritado.
- Ui, é melhor chamar a polícia! – Diz a Sra. Maria Nabo, assustada com a ideia de intrusos no seu lar.
- Polícia, minha senhora?! Os senhores vão é pagar os tratamentos deste jovem desgraçado e não fosse o seu bom coração, iriam ter problemas em tribunal!

Depois de entregar o dinheiro do tratamento e de pedir desculpas, para evitar danos psicológicos no toxicodependente, entra em casa atordoado com a bizarria da realidade.
Sem jantar, vão todos dormir, porque certamente estavam a ter um sonho colectivo e o melhor sítio para o viver é na cama e pela manhã ao despertarem, tudo teria passado!
Uma hora depois de o novo dia ter começado na casa do Zé Nabo, toda a família sai aprumada. Zé Nabo fecha a porta à chave e ao dirigirem-se para o carro, a família ouve:
- Com que então a trancarem a porta?! É mesmo para complicar a vida aos desgraçadinhos…bando de insensíveis!
Quando Zé Nabo, a esposa e os dois filhos olham na direcção da voz, vêm Álvaro e são puxados para o mundo real, que lhes tinha parecido um sonho, no dia anterior!
- Mas o que é que o senhor quer? – Pergunta Zé Nabo, num misto de irritação e desapontamento.
Na realidade, Álvaro, queria manter o “tacho” que lhe dava alguma importância na ONG, porque nunca se conformou com o trabalho apagado, mas sério, na fábrica onde trabalhava.
- A sua família está referenciada como “desconfiada” e …”racista”! – Determina Álvaro.
- Desconfiada e racista?!!! Eu tranco a casa para proteger o que é meu!
- Não, não! O senhor tem maus instintos ao querer complicar a vida dos mais necessitados! – Diz Álvaro, prosseguindo – Quer que outro drogadinho aleije a mãozinha ao entrar em sua casa? Por que razão quer complicar o assalto dos ciganinhos, para lhe roubarem a roupa, para venderem na feira, ah? Só quer que a sua vida corra bem? E os ilegais, sem emprego?! Como quer que comam se lhes tranca a casa?
- Mas a casa é minha?!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
- ABRA JÁ A CASA, PARA OS DROGADINHOS E AFINS, SEU INGRATO…E PONHA-SE A ANDAR. – Ordena Álvaro, com o corpo esticadinho.
Num instante, como quem recebe a ordem de uma patente militar superior, abre a casa e ausenta-se, desta cena de filme, com a família.
À noite, chegados a casa, ouvem imenso barulho. Quando entram na sala, está acampado um clã cigano a festejar um casamento, avançam na casa e os quartos estão tomados por ilegais africanos, e de leste, e sul-americanos…, na casa de banho encontraram mortos-vivos de seringas penduradas nos braços. Na casa, o único espaço de vago é a cozinha e é de lá que telefonam à polícia de onde respondem:
- Caro senhor, compreendo a sua preocupação, mas da parte da tarde recebemos uma chamado do Sr. Álvaro, a transmitir que “desgraçadinhos coitadinhos” encontraram a dispensa fechada! Tivemos que ir aí arrombá-la. Para a próxima deixe tudo aberto, Sr. Zé Nabo, poupa trabalho a todos. – Responde o comissário de serviço.
A família Nabo, instala-se na cozinha e tenta adormecer depressa, com o desejo, mais forte do que nunca, de que tudo aquilo seja mesmo um sonho.
Pela manhã, em vez de acordarem ao som do despertador, acordam sobressaltados com os berros de uma mulher, a gritar- SANGUE! SANGUE! SANGUE!...
Zé Nabo, abre uma frincha na porta da cozinha e vê, a correr pelo corredor, uma cigana de idade, com um lençol manchado de vermelho. Volta a fechar a porta e virado para a família, diz – Não morreu ninguém, a noiva era virgem! Vamos embora depressa!
Saídos de casa, a vontade era a de regressar o mais tarde possível. Só quando já não aguentam o frio da noite, regressam a casa. A algazarra continua, e os Nabos seguem o corredor directos ao único espaço que não está tomado, a cozinha. Estranhamente, por cima da porta está instalado um reclame luminoso com caracteres esquisitos!
Zé Nabo abre a porta e vê meia dúzia de chinocas a bater umas cartas e uma roleta a girar na marquise…a cozinha está transformada em casino. Zé Nabo olha para trás e das paredes do corredor desapareceram as fotografias de família e dos seus antepassados. Roubaram a sua história e agora sem espaço para eles, sentem-se uns estranhos na própria casa! Foram dormir para o quintal.
No dia seguinte o ritual desta estranha realidade, repetiu-se. A família saiu logo pela manhã e Zé Nabo apercebe-se da presença de Álvaro, que pergunta a alguém:
- Estão a ser bem tratados?
Ao qual, esse alguém responde – Os donos da casa olham para nós com cara de esquisitinhos!
- Pois é! Depois não querem que vocês sejam uns revoltados…discriminados desta maneira! Mas a minha ONG está aqui para vos proteger. – Conclui, seguro, Álvaro.
Nessa noite, quando chegam a casa, os Nabos, arriscam espreitar se têm um lugar na própria casa. Quando entram no corredor, vive-se um ambiente de guerra, pelos desentendimentos de pessoas tão diferentes. Assustado com o cenário, quando antes os desentendimentos naquela casa, eram meras discussões porque deixava um chinelo fora do sítio ou um raspanete aos miúdos, Zé, mais num acto irreflectido do que racional, grita – PAREM! Saiam já da minha casa.
De inimigos, os ocupantes da casa unem-se e “apertam” a família Nabo, que sentindo-se ameaçada, consegue escapar para dentro da dispensa, levando consigo um livro de história!
- O que vamos fazer? – Perguntam os filhos.
Zé Nabo abre o livro e lê-lhes “…confinados a um buraco na montanha, lutaram, liderados por Pelágio, rechaçando o inimigo ocupante. Desta maneira se formou o Reino das Astúrias e se iniciou a Reconquista Cristã, isto é, a recuperação dos territórios em poder dos Muçulmanos. A Reconquista cristã, durou oito séculos, cheios de guerras, mas também de periodos de paz.”

Cinco dias depois, os Nabos, liderados por Zé, já controlavam a dispensa, a cozinha e os quartos, vivendo neste momento um período de relativa paz com os ciganinhos, ocupantes da sala, e com os toxicodependentes, ocupantes da casa de banho. Álvaro, para manter o “tacho” na ONG, é agora um acérrimo defensor dessa minoria…os Nabos!

domingo, 6 de outubro de 2013

Há branco e branco, há que tentar...e errar!

Há uns anos atrás, aliás, há uns bons anos atrás, ainda no tempo do escudo e ainda não se imaginava que ele iria acabar, estava eu numa loja dos “Trezentos”, onde, coerentemente, tudo era vendido a trezentos escudos, e encontro numa estante, uma cestinha com um cacto e uma flor ao módico preço de cento e cinquenta escudos.
- O preço está certo? – pergunto à menina que está por detrás do balcão, na esperança de que ela dissesse que tinha havido um engano e que tudo era a trezentos.
- Sim, sim, é esse o preço. – responde-me.
A minha vontade imediata foi abandonar a loja…nunca gostei de incoerências. Para isso, que se chamasse loja dos “Preços variados até trezentos escudos”, mas em vez disso, fui assaltado por um rasgo de romantismo juvenil e comprei o cestinho, tão bonito…e baratinho.
Fui oferecê-lo à minha namorada, de sorriso na cara!
- Toma, é para ti! – digo, com um tom de voz pró-melado e de braço estendido com o cestinho bonito e baratinho, na esperança de resgatar um beijo apaixonado!
- Que feio! – responde-me.
Compreendo que o cestinho, olhando bem para ele, era mais barato do que bonitinho, mas não era preciso tamanho realismo!
Naquele momento precisava de um amigo, daqueles a quem oferecemos coisas e está tudo bem, porque o que conta é a intenção e logo depois esquecemos a prenda e perdemos-nos a falar de miúdas e algum futebol.

Anos mais tarde, a namorada tornou-se esposa, admirável pela postura, pelo realismo, que faz com que não confunda as prioridades e não se zangue se me esqueço do seu aniversário…porque para ela, mais importante do que as datas, é o dia-a-dia!
Ufa, ainda bem, porque nunca me lembro do seu aniversário, nem mesmo do meu, que me é recordado pelo telefonema da minha mãe, desejando-me os parabéns e fazendo-me lembrar que a minha existência é das coisas mais importantes para alguém!
Como tal, não temos datas, ansiosamente esperadas, como se não houvesse antes e depois desse dias especiais…
Mas…há um dia no ano, em que ela me diz:  – Sabes que dia é amanhã?
Esse dia de amanhã, é o dia do nosso casamento, que sei que é em Setembro, mas não me lembro do dia, apenas sei que é no dia seguinte ao dia em que me diz: – Sabes que dia é amanhã? – que de forma inteligente relembra, evitando dramas!
Mas é precisamente aqui que o meu drama começa. Se a Cristina, mesmo sem lhe dizer nada, acerta naquilo que quero, ou preciso, as minhas escolhas costumam ser um tiro ao lado, que a psicanálise explica pelo trauma que vivi na adolescência, com a compra de um cesto com um cacto e uma flor, por cento e cinquenta escudos, numa loja dos trezentos, para oferecer a uma miúda com bom gosto! Foi a tempestade perfeita, que muitos, por muito menos se metem na droga.
Mas desta vez, quando diz a frase que insinua que amanhã fazemos anos de casados, estamos em frente a uma loja de malas. Fina como o Rato, aponta para a estante principal e diz: – Gosto muito daquela mala!
Ouço e comento com os meus botões: - É desta que vou acertar.
Sossegado ,iria passar na loja no dia seguinte, porque a estante estava cheia de malas iguais e todas…brancas!
Ah, é hoje! No fim do trabalho passo na loja e digo à senhora, apontando para a estante – Quero uma mala branca!
Sem eu perceber patavina, a senhora da loja em vez de tirar a que está mais à mão, tira a terceira mala, a contar da esquerda, da terceira prateleira!
Ao pôr a mala num saco, eu peço:  – Embrulhe, por favor!
Dirijo-me para casa, com um sorriso de orelha a orelha. Quando chego a Cristina já está pronta para sairmos…vamos jantar fora.
- Morzinho, isto é para ti!
Ela sorri, adivinhando que a prenda é a mala que ela apontou na montra da loja.
- Pousa a prenda no quarto. Abro quando chegarmos! – diz-me
Possuido de ansiedade por, pela primeira vez em dezassete anos desde a loja dos trezentos,acertar numa prenda oferecida à minha mulher, peço-lhe: – Abre agora, abre, abre!
Perante a insistência ela tira o embrulho da saca, abre-o, e: – A mala é bonita, mas não era esta que eu queria! – diz-me.
- Ui, mas é a mala branca que apontaste na montra da loja!
- Eu apontei para a mala branco pérola, que estava ao lado da mala branco sujo, na quarta prateleira…tu trouxeste-me a mala branca!

Fui apontar o tom de branco que ela quer, para no dia seguinte passar na loja, para trocar!