Já era tarde e, também,
tardava a fechar o computador. Apesar do dia ter corrido bem na vida real, ao
serão ainda não tinha conseguido “postar” nada queriducho, estilo “eu dava a
vida pelo pai natal”, ou pseudo-inteligente, do tipo que ninguém percebe, mas
onde se faz um “like” por via das dúvidas para não se fazer má figura. Algo que
também me estava a deixar tenso era o facto de ainda não ter recebido nenhum
pedido de amizade, confirmando a estatística do facebook de um por dia, uma das
razões porque abdiquei da realidade, em prol do “social virtual”!
Era já era muito tarde quando “cai”
um pedido de amizade. Sôfrego, clico no ícone para avistar o pedido. Era uma
figura estranha, com um nome estranho e que vive na Índia. De imediato aceitei
aliviado, fechei o computador e fui-me deitar. Este novo amigo relaxou-me o
suficiente para não ter que tomar a medicação para dormir: – Obrigado bom
amigo! – pensei…
De manhã acordo de um
pesadelo, em que estava no meio de uma tempestade, com o sol a entrar pela
janela! É sábado de manhã, o momento oportuno para partilhar algo ligeiro e
queriducho, que não tinha conseguido postar na noite anterior: – Estava a
sonhar com água e está sol…LOL! J.
Fiquei paralisado, sentado na
cama, à espera de ânimo para seguir a minha vida! Essa fonte de energia, para
carregar as minhas “baterias vazias”, chegou trinta e sete minutos depois, com
um “like” do meu novo amigo indiano! Levantei-me, preparei-me e fui até ao
café. Não combinei nada com ninguém…aparece sempre alguém conhecido!
Quando entro na pastelaria, lá
estavam três amigos, não daqueles “old fashion”, que esboçam emoções quando nos
vêem, mas daqueles, do “social virtual”, que nos fazem parecer invisíveis aos
seus olhos, mesmo estando ao lado deles. Como mandam as regras destas amizades
que nos acrescentam valor, nem nos olhamos!
Já na mesa, a empregada pousa
a chávena de café que pedi. Tiro uma fotografia à chávena, que partilho no
Facebook com o comentário: – Pedi um café curto e a chávena veio, quase cheia J!
Num curto espaço de tempo, os
meus três amigos, espalhados em três mesas da pastelaria, fizeram “like”, ou
comentaram a minha fotografia, a que se juntaram mais pessoas comentando que
lhes aconteceu o mesmo nessa pastelaria…aos poucos fomos descobrindo que a
máquina devia ter um problema de dosagem…e assim fomos trocando opiniões sobre
o assunto, enquanto a realidade crua aparecia nas notícias que passavam na
televisão!
Lá tomei o café cheio, que
tinha pedido curto, paguei e saí, sem olhar os meus amigos!
No regresso a casa, cruzo-me
com o Joquinha, amigo de adolescência, que rasga um sorriso e me cumprimenta
com alegria. Envergonhado e olhando para o chão, digo-lhe: – Tudo bem? – e
apresso o passo. Continuo a minha caminhada e já recomposto do triste episódio,
vejo que em sentido contrário vem a Lurdes, minha amiga virtual e com quem nunca
falei pessoalmente, como mandam as regras.
Depois de nos cruzarmos, ela a
olhar para a direita e eu para o ar, ouço um berro. Olho para trás e vejo a
Lurdes deitada, agarrada à perna. Volto atrás, “saco” de telemóvel e com um
braço por cima da Lurdes e virado para a câmara, com um sorriso bonito, tiro
uma fotografia e sigo caminho. Durante o trajecto “posto” a fotografia com a
mensagem: – A Lurdes está deitada, com um entorse, na Avenida da Estação Nova.
Bora lá ajudar, agradeço a partilha!
Este meu gesto, fez-me sentir
bem e leve, e foi suficiente para não me deixar abater pelos cinco mendigos e crianças
a chorar, por quem me cruzei a seguir...
Durante o dia as partilhas
foram-se sucedendo e já ao final da tarde, o Telmo, cuja amizade estamos a
tentar recuperar, após o ter cumprimentado quando nos cruzamos na rua, depois
de uma amizade solidificada no “social virtual”, “posta” nova fotografia da
Lurdes, com a mensagem: – A Lurdes já não está no mesmo sítio! Arrastou-se e
continua agarrada à perna no Largo de S. Martinho! Partilhem.
Novamente ansioso, desta vez
para recuperar uma amizade, partilhei a fotografia da Lurdes, para ajudar o
Telmo a sentir-se bonzinho!
Sem comentários:
Enviar um comentário