Era uma vez…esta história não começa assim!
-Atira-te, atira-te ao mar! - Diz ela em tom decidido.
Estão os dois no limite de uma falésia, a cem metros
acima do nível do mar.
- Mas eu não sei nadar. Se me atiro afogo-me por mais que
esbraceje…é uma questão de tempo! -responde ele não querendo acreditar no que
ouvia da boca de Maria.
- Não vês que é a coisa mais sensata a fazer? Quem mais gosta
perde, e tu perdeste. Vá lá. Somos adultos, eu fico aqui em terra e segura e tu
atiras-te. Se não for no mar, morres nesse teu banho de lágrimas. Arrisca, quem
sabe se enquanto te afogas, por momentos não descobres um novo mundo!
Neste discurso de suposta, angélica e piedosa
racionalidade de Maria, Alexandre Roma, nome da nossa triste figura, depressa
penetra nos seus próprios pensamentos e conceitos da vida, questionando-se por
que razão não é tudo simples, já que tudo é complicado. Mas do discurso de
Maria, Alexandre Roma capta duas palavras importantes, “arrisca” e “descobres”,
que são o dispositivo para uma explosão interior, mais uma em Alexandre Roma,
qual Dom Quixote, se calhar este mais triste, ou não, e lança-se da falésia, resultado
de um impulso e não de um pensamento.
A queda de Alexandre Roma demorou cerca de quinze segundos,
que ele aproveitou ao máximo para experimentar a sensação de queda livre,
porque certamente iria morrer do impacto com a água. Se isso não acontecesse,
do afogamento não se safava, tendo no máximo mais dois minutos de vida
consciente, pelo que Alexandre Roma quis aproveitar ao máximo os seus dois
minutos e quinze segundos de vida.
Para Alexandre Roma, estar dois minutos seguidos
consciente, seria um novo record nos seus trinta e tal anos de vida. Se fosse
contemporâneo de Dom Quixote, certamente seriam grandes amigos. Iriam partilhar
batalhas imaginárias, copos reais e mulheres…imaginárias.
Alexandre Roma cai em silêncio, usufruindo dos sentidos
nesta sua última experiência em vida, não contando com a derradeira experiência, que seria a da
morte.
Eis que é avistado por quatro gaivotas que decidem ajudá-lo
e precipitam-se para Alexandre Roma, agarrando-o pelos braços e pernas e
iniciaram um bater de asas louco para diminuírem a velocidade de queda da nossa
triste figura. De nada adiantou, apenas diminuíram a velocidade em três metros
por hora!
Splash! Alexandre Roma atinge a água com uma barrigada
monumental, que nos Jogos Olímpicos na modalidade de Salto para a Água, certamente
teria nota 0.
Neste impacto, a dor que Alexandre Roma sentiu não foi
física, mas sim interior, muito profunda. Sentiu-se a esvaziar de vida e por mais
que esbracejasse não conseguia vir à superfície. A Morte estava próxima!
Desesperado e impotente, Alexandre Roma deixa de lutar
pela Vida e chora, chora,…de tal maneira que o Mar ficou mais salgado e o nível
da água subiu um metro em todo o mundo, como se ele fosse rodeado por uma
barragem gigante, que de uma vez só, abrisse as comportas, deixando os cientistas
alarmados, pensando que o processo de degelo dos glaciares tinha acelerado.
Alexandre Roma já não tem oxigénio nos pulmões, suas
artérias, veias e órgãos ficam inundados de água. O sangue que o coração
bombeia já não transporta vida, as células começam a morrer, é o fim de Alexandre
Roma…
Inexplicavelmente, a teoria da evolução e dos mais bem
adaptados, que explica mudanças ao longo de milhares e milhões de anos, acontece
em Alexandre Roma em poucos segundos, o seu corpo começa a mudar, todos os seus
órgãos se adaptam à vida marinha. Já consegue respirar!
Da morte certa Alexandre Roma desperta, e o primeiro
pensamento que lhe surge é a imagem de Maria.
Neste momento a nossa figura, ainda triste figura,
desconhece o maior poder do sal do mar. Este é capaz de colar todos os cacos de
um coração despedaçado!
Fim
da 1ª parte
Continua no próximo verão.
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