quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Adélio Dani (11º episódio)

...
Chega a casa por volta do meio-dia e recolhe-se no seu quarto. Pensa, pensa e ao fim de cinco minutos já dorme e sonha, sonha!
É um novo dia e Adélio Dani está decidido a pôr em prática tudo aquilo com que sonhou.
A primeira coisa que fez foi escrever uma carta para Rubi a pedir que voltasse, pois precisava dele com urgência. Rubi emigrou há uns anos atrás quando se apercebeu, antes de Dália e Adélio Dani, que Augusto, possivelmente, não voltaria da faina. Desde então, todos os meses, Rubi envia para casa três sacas de comida seca, Wiskas.
A segunda coisa a fazer é esperar que Rubi regresse. Isso acontece três dias depois, ao início da tarde.
- Rubi, meu amigo lindo, que saudades! – Diz Adélio Dani, abraçando o seu amigo canino.
- Au,au,au,au,au,au,au! – Ladra Rubi, enquanto prega umas lambidelas sentidas no seu amigo humano.
Após o reencontro, entram os dois em casa, e Adélio vai lavar a cara e mudar a t-shirt babada. Como não tem mais nenhuma lavada volta a vestir a mesma e regressa à sala onde está Rubi.
- Rubi, amigo, eu pedi-te para regressares com urgência, porque tenho uma coisa importante para te dizer!
- Auf, auf, auf!
- Já te digo! Estive a pensar na minha vida e não cheguei a decisão nenhuma, por isso tomei uma decisão!...Vou em retiro para o monte, e só saio de lá quando tiver tomado uma decisão bem decidida!
- Au, auuuuuuu!
- Preciso de ti porque tenho medo de ir para o monte sozinho…senão não ia…continuava indeciso! Bem Rubi, arrancamos amanhã, durante a manhã…só falta contar à minha mãe, digo-lhe antes do jantar!
- Au, au, au,au,au,au,au!
- Tens razão, conto-lhe depois do jantar e arrancamos amanhã, durante a tarde!
No final desse dia Dália chega a casa vinda do mercado, com flores nas mãos, para preparar um arranjo para entregar no dia seguinte.
- Olá Adélio, estás bom filho?
- Estou mãe, já viste quem está aqui?
- Ohh, um rafeirinho! Arranjaste um amigo novo?
- Não mãe, olha bem para ele!
E Dália fixa o focinho de Rubi e este, com a língua de fora, fixa a cara de Dália…e assim ficam. Criou-se um momento tenso. A última vez que Adélio Dani viu uma cena destas foi no cinema ao ver o filme “Duelo ao sol”, que terminou com um dos intervenientes alvejado. Com receio, decide intervir!
- Então mãe, não estás a reconhecer?
- Ui, é o Moreira?
- Não mãe! Anda lá, outra tentativa, eu dou-te uma ajuda, é um cão!
Repentinamente, Dália, exalta-se:
- O quê?! É o cão do teu pai, depois deste tempo todo…! E o bacalhau?
- Não, mãe, não! É o Rubi!
- Rubi!? Não me lembro!
- Então?! É o nosso cão que estava para fora e nos manda os sacos de comida seca!
- Por falar nisso filho, é o que tu vais comer hoje! Prepara o teu jantar, que eu tenho um arranjo para fazer para entregar amanhã!
Dália vira costas e vai tratar do arranjo, enquanto Adélio, juntamente com Rubi vão jantar um pratinho de comida seca. No final, vão à sala para Adélio falar com a mãe.
- Mãe, tenho uma coisa para te dizer!
- O que foi filho? – Diz Dália, enquanto continua a trabalhar no arranjo.
- Amanhã, durante a tarde vou para o monte…e o Rubi vai comigo!
- Está bem, mas anda a horas para o jantar!
- Não mãe, eu vou e só regresso quando decidir o que fazer na vida!!!
Dália, por momentos fica estática, volta-se para o filho e dá-lhe um abraço como se fosse o último…como se ele fosse embarcar para um planeta sem nenhumas condições para haver vida, e quando lá chegado, a nave explodisse, não dando mesmo hipótese de ele voltar caso ele sobrevivesse ao ar cem por cento irrespirável e às temperaturas de 5000 º c positivos ou negativos! Dália volta-se de novo para o arranjo.
 Nasce um novo dia em Campanhã.
Dália já saiu para o mercado, pois tinha que entregar o arranjo de flores bem cedo. Rubi está desperto à beira de Adélio Dani, à espera que este acorde. Acordou. Levanta-se e prepara o saco de viagem: Uma saca de plástico com dois pacotes de bolacha “Maria”!
- Rubi, estou pronto. Já é a parte da tarde do dia, portanto como combinado, podemos ir para o monte!
- Auuuuuuuuuuuuuuuuu!
E os dois arrancam e instalam-se no monte a oitocentos metros de casa. Sobem até ao ponto mais alto e montam uma cabana, encostada ao único pinheiro. Quatro paus ao alto e uma cobertura, pouco impermeável. Já instalados, sentam-se a contemplar a paisagem inspiradora: meia dúzia de eucaliptos e a alguma distância os prédios da cidade e as chaminés de algumas fábricas a libertarem fumo tóxico.
- Aqui, Rubi, vamos ter o sossego suficiente para eu pensar na minha vida! - Diz Adélio Dani, enquanto trinca uma bolacha “Maria” e dá outra a Rubi.
A noite cai, assim como os dois amigos, empurrados pelo sono. Ouvem-se os grilos, os passarinhos e um casal de namorados que escolheram aquele local para namorarem durante meia horinha!
Nasce um novo dia, e Adélio Dani e Rubi, em vez de serem acordados pelo chilrear dos passarinhos ou pelo uivo do vento a trespassar os ramos dos eucaliptos e do pinheiro, são acordados pelo barulho de máquinas.
- A Mãe Natureza está maluca! Que espécie de ave tem este cantar? – Interroga-se Adélio Dani.
- Aaaaauuu, aaauuuu! – Responde Rubi.
Adélio Dani abre melhor os olhos e apercebe-se de que aquele barulho estranho não é de um pássaro, mas sim de obras para a construção de um chalé, mais um, para o presidente da Junta de Miragaia, Venceslau Roma. Adélio abre ainda melhor os olhos e além dos trabalhadores, consegue ver o Presidente e o seu filho Venceslau Júnior a roçar o rabinho num Caterpillar.
Por um lado, Adélio ficou contente, porque afinal a Mãe Natureza não estava maluca, mas por outro lado:
- Rubi, assim não tenho o sossego e paz que preciso! Temos que subir mais alto.
No final desse dia desmontaram a cabana e subiram ao alto do pinheiro, remontando-a. Nesse mesmo final de dia a obra foi embargada.
Nasce um novo dia, Adélio Dani e Rubi são acordados pelo som de aves, cinco no total, um casal de melros e um casal de passarinhos, com o filho, que discutiam de forma brava, a pertença de um ramo, para a construção de um ninho.
- Isto sim, agora aqui no alto já não se ouve o barulho das máquinas! Apenas os sons harmoniosos da Mãe Natureza, como esta passarada! – Rejubila Adélio Dani, continuando: – Agora sim, posso pensar na minha vida em paz e sossego!
- Auuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu!
Os dois amigos entram num estado de espírito diferente, entram em meditação plena e o seu metabolismo é reduzido ao mínimo, tanto que uma bolacha “Maria” dá para cinco dias!

Os dias passam, as semanas passam, os meses passam…em Campanhã nada muda…
Estão passados quatro anos, e:
- Iupi, é isso! Descobri! – Berra de forma gloriosa Adélio Dani após despertar do transe/sono.
Com o susto, Rubi cai do ramo onde dormia. Aterra três ramos mais abaixo. Adélio com o auto-susto cai abaixo do pinheiro.
- Rubi, o que estás a fazer aí em cima? Desce amigo.
- Au,au,au,au,au!
- Já sei o que quero ser, vamos para casa para contar à minha mãe! – Olha para o saco da comida, e: - Ainda temos bolachas para a viagem, boa!
A viagem de regresso começa ao final da tarde. Quinze minutos depois chegam a casa. Dália ainda não chegou, Adélio Dani e Rubi esperam na soleira da casa.

(continua)

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